O encontro inter e transdisciplinar reúne pesquisadores, estudantes e profissionais do Brasil e do exterior foi concluído com a divulgação de carta aberta à sociedade
Por Sônia Araripe e Felipe Araripe, da Plurale
Fotos de Felipe Araripe
Pesquisadores, estudantes e profissionais de diferentes especializações e regiões do Brasil e do Exterior estiveram reunidos em Recife (PE) esta semana, dos dias 12 a 17 de agosto, para participar da I Reunião de Perspectivas Multidisciplinares sobre as Mudanças Climáticas. da RESICLIMA. O encontro inter e transdisciplinar foi concluído com a divulgação de carta aberta à sociedade, na qual é apresentado um cenário com alertas e sugestões para o enfrentamento do agravamento da crise climática.
A escolha do Recife como sede deste evento é simbólica, pois a cidade é uma das mais vulneráveis do mundo às mudanças climáticas. Isso reforça a urgência de uma ação coordenada e efetiva diante da crise climática crescente que afeta o Brasil e o mundo. Participaram da reunião: jornalistas, divulgadores de ciência, biólogos, etnobiólogos, nutricionistas, agrônomos, ecólogos, educadores populares, profissionais de educação física, professores, cientistas ambientais, economistas, cientistas sociais, psicólogos, engenheiros florestais, artistas e farmacêuticos.
A Rede Resiclima é uma colaboração entre instituições de pesquisa do Brasil e do exterior, atualmente com coordenação geral localizada no Centro de Biociências da Universidade Federal de Pernambuco. Originária de diversas instituições acadêmicas, como UFPE, UFRPE, UFPB, UPE, UFMA, Unifesspa, UNIVASF, UNEAL, UFAL, USP, UnB, UFRN, PUC-Rio, UFU, Universidad Nacional del Comahue (Argentina), Universidad Autónoma del Estado de Hidalgo (México), Universidade do Michigan (EUA), Universidade de Turku (Finlândia) e Universidade de Osnabrück (Alemanha), a rede promove uma abordagem integrada para entender as variadas dimensões das transformações climáticas e suas implicações.
“Foi uma semana intensa de muito trabalho e nos permitiu uma visão sistêmica para a abordagem e enfrentamento das mudanças climáticas”, explicou o Professor Ulysses de Albuquerque, coordenador da RESICLIMA (na foto acima) em entrevista à Plurale. A carta aberta divulgada neste sábado (17/10) destaca que a recente tragédia no Sul do Brasil, com suas enchentes devastadoras, é um dos exemplos mais visíveis das mudanças climáticas nas vidas.
Pesquisadores mostraram no encontro que os impactos vão além desses eventos extremos e afetam silenciosamente nossa saúde, economia e bem-estar. O documento alerta que os pesquisadores estão “muito preocupados com o negacionismo e as fake news sobre o tema.” E conclui: “Não podemos mais ignorar esses impactos profundos, às vezes irreversíveis, ou adiar as ações necessárias para combatê-los. As atuais ações e políticas para mitigar esses efeitos já não são mais suficientes para garantir a saúde e a segurança dos seres humanos.”
Albuquerque é considerado um dos cientistas mais influentes do mundo, segundo a lista atualizada da Elsevier, empresa global de informações analíticas, em colaboração com pesquisadores da Universidade de Stanford (EUA).
Equipes de pesquisadores da UFPE estão avaliando os efeitos para a Caatinga – sua gente e a biodiversidade, assim como para as plantas da região e também para a cadeia alimentar do sertanejo. Da USP, professores e alunos de Doutorado e Mestrado da Faculdade de Saúde Pública apresentaram resultados também do que chamam de “sindemia global”, em que a desnutriçao, obesidade e as mudanças climáticas estão interligadas e se agravam mutuamente.
E para mostrar que o cenário também é global, pesquisadores PHDs da Argentina, México e Guiana Francesa, que integram a Rede, trouxeram estudos de caso do impacto das mudanças climáticas para povos originários na Patagônia argentina, em regiões semiáridas mexicanas e ainda na área de floresta da Guiana Francesa, região amazônica.
A carta final da I Reunião da RESICLIMA resume bem alguns destes muitos efeitos. “Os efeitos das mudanças climáticas são complexos e muitas vezes imperceptíveis, mas têm consequências graves”, destaca o documento. Entre os impactos discutidos durante nossos debates, destacam-se:
– O aumento dos casos de ansiedade e depressão, especialmente entre as populações mais vulneráveis;
– Problemas no desenvolvimento neurológico, prejudicando a aprendizagem de crianças e jovens e ameaçando o futuro das próximas gerações;
– Crescente incidência de diferentes formas de má nutrição, tais como a desnutrição e obesidade, comprometendo a saúde física e mental da população;
– Maior ocorrência de problemas cardíacos e acidentes vasculares cerebrais (AVCs), sobrecarregando o sistema de saúde.
– Redução da capacidade de alimentar e cuidar da saúde das pessoas devido ao esgotamento dos recursos naturais;
– Aumento na incidência de desafios climáticos, sociais, culturais e ambientais para povos indígenas e comunidades tradicionais de todo o mundo.
Professor Ulysses de Albuquerque espera que a carta atinja não só o meio acadêmico, mas também os tomadores de decisões públicas e a sociedade civil. Entre as temáticas abordadas pelo evento, estiveram a utilização de dados de grande escala para analisar e compreender os impactos das mudanças climáticas, o uso de metodologias de sistemas complexos para saúde pública e clima, além de discutir sobre a biodiversidade alimentar como estratégia de adaptação às mudanças climáticas, suas oportunidades e desafios.
A jovem estudante de Mestrado de Etnobiologia e Conservação da Natureza da UFPE, Rayanna B. Marques (vídeo abaixo), está começando a pesquisar o impacto das mudanças climáticas na comunidade de pescadores artesanais e marisqueiras na Ilha de Deus, tradicional área de pesca artesanal na região.
“Ainda estamos começando a pesquisa de resiliência agroecológica. São sete meses de pesquisa. Mas é claro que há impactos, como especulação imobiliária e escassez de recursos pesqueiros. A temperatura da água aumentou. Teve a construção de empreendimentos imobiliários na região. A comunidade está resistindo. O projeto surgiu de uma demanda da comunidade. Queremos poder ajudar esta população que subsiste da pesca, para entender melhor o que está acontecendo e o que ainda pode acontecer.”
A cobertura completa do evento está nas mídias sociais de Plurale – twitter e instagram.
(*) Equipe de Plurale viajou a convite da organização do evento.
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