O pesquisador Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo explora os resultados de uma pesquisa sobre como diferentes segmentos da população brasileira veem e se preocupam com as mudanças climáticas.
Discutindo desde a influência da escolaridade, classe social e posicionamento político até o impacto dos meios de comunicação, este episódio oferece uma visão detalhada sobre a consciência ambiental no Brasil.
A conversa também toca em como as mudanças climáticas afetam a população da Caatinga, revelando as complexidades da relação entre sociedade e natureza neste contexto.
A Rede Resiclima é uma colaboração interinstitucional que reúne pesquisadores dedicados ao estudo das mudanças climáticas.
A rede promove uma abordagem integrada para entender as variadas dimensões das transformações climáticas e suas implicações.
Os projetos da Rede Resiclima são financiados pelo CNPq e incluem pesquisadores de diversas instituições acadêmicas.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo é graduado em ciências biológicas pela Universidade Federal de Pernambuco, mestre e doutor em biologia animal pela mesma universidade.
Atualmente é professor adjunto do departamento de biologia da Universidade Federal Rural de Pernambuco, onde desenvolve suas pesquisas vinculadas ao laboratório de síntese ecológica e conservação da biodiversidade.
Ele tem interesse nas linhas de pesquisas de ecologia política, ecologia de ecossistemas e ecologia numérica, focando em como mudanças do uso e cobertura do solo, bem como mudanças climáticas, alteram a relação sociedade-natureza.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: Minha trajetória nas pesquisas sobre mudanças climáticas é um pouco tortuosa. Eu venho de uma formação em ecologia, trabalhando com ecologia de processos, mas utilizando insetos como modelo analítico. Mais especificamente, insetos necrófagos, o que não tem nada a ver com o que faço hoje em dia.
Eu trabalhava com a interface entre entomologia forense e ecologia. Não gostava muito do que fazia e estava prestes a desistir do doutorado quando, em um curso de campo na Caatinga, percebi que talvez ali fosse uma área onde eu poderia me debruçar mais sobre as expertise que envolvem ecologia.
Foi por volta de 2016, 2017, no final do doutorado, que comecei a me interessar mais pela ecologia de processos sem considerar modelos animais ou vegetais como objeto de estudo, focando nas relações entre a vida e o ambiente em si.
Logo em seguida, fiz o pós-doutorado com o professor Felipe Melo na Universidade Federal de Pernambuco, onde mergulhei mais fundo na ecologia política e ecologia de ecossistemas. Foi aí que as mudanças climáticas entraram no meu radar.
Conheci o professor Ulisses Albuquerque, que me convidou para fazer parte da Rede Resiclima. Atualmente, sou professor na Universidade Federal Rural de Pernambuco e atuo como pesquisador colaborador e coordenador do núcleo de diversidade, equidade, gênero e etnias na Rede Resiclima.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: A pesquisa foi desenvolvida pelo Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro em parceria com o IBOPE e o Núcleo de Mudanças Climáticas da Universidade de Yale. Foi uma pesquisa qualitativa e quantitativa realizada em todas as unidades da federação do Brasil, incluindo o Distrito Federal, com uma amostragem de aproximadamente 2.600 pessoas.
O objetivo era entender como os brasileiros percebiam as mudanças climáticas. A pesquisa abordou questões como o nível de preocupação com o clima, percepção sobre desmatamento, aquecimento global e queimadas.
Entramos nesse projeto para analisar dados secundários e observar como diferentes perfis socioeconômicos e demográficos influenciam a percepção e preocupação com as mudanças climáticas.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: Sim, definitivamente. Observamos que o perfil socioeconômico, escolaridade, e posicionamento político influenciam significativamente a percepção e preocupação com as mudanças climáticas.
Pessoas com maior nível de escolaridade tendem a ser mais preocupadas, especialmente aquelas que têm acesso a uma educação formal de qualidade. Em termos de posicionamento político, indivíduos que se identificam com a esquerda tendem a ser mais preocupados com as mudanças climáticas do que aqueles que se posicionam à direita.
Essa diferença pode ser explicada pelas pautas mais progressistas e voltadas ao social da esquerda, que incluem uma preocupação maior com o meio ambiente e a sustentabilidade.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: Criamos um índice baseado no IDH, variando de 0 a 1, onde 0 representa indivíduos muito preocupados e 1, os que não estão preocupados. Observamos que o Brasil, em geral, está bastante preocupado com as mudanças climáticas, com cerca de 88% do território mostrando altos níveis de preocupação.
No entanto, algumas diferenças regionais são notáveis. Por exemplo, Roraima apresentou um dos piores indicadores de preocupação, enquanto o Distrito Federal teve os melhores. Isso pode ser explicado pelo acesso desigual à educação formal entre essas regiões.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: Sim, exatamente. Pessoas posicionadas do centro à direita tendem a ser menos preocupadas com as mudanças climáticas do que aquelas à esquerda. Isso se deve às pautas mais econômicas e liberais da direita, que muitas vezes priorizam o crescimento econômico em detrimento da conservação ambiental.
Por outro lado, a esquerda, com pautas mais progressistas e sociais, tende a valorizar mais a relação entre sociedade e meio ambiente, refletindo em uma maior preocupação com as mudanças climáticas.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: Curiosamente, encontramos que pessoas de classes sociais mais baixas tendem a ser mais preocupadas com as mudanças climáticas. Isso pode ser explicado pelo conceito de racismo ambiental, onde populações vulneráveis sofrem mais diretamente os impactos das mudanças climáticas.
Essas comunidades, muitas vezes localizadas em áreas de risco, como encostas e periferias, enfrentam diretamente os efeitos de eventos climáticos extremos, como chuvas torrenciais e deslizamentos de terra, aumentando sua percepção e preocupação com o clima.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: Sim, definitivamente. Observamos que pessoas que se informam apenas pela TV aberta tendem a ser menos preocupadas com as mudanças climáticas do que aquelas que utilizam outros meios, como internet, rádio e jornais.
Isso destaca a importância de uma comunicação científica eficaz e acessível, que possa traduzir o conhecimento científico de forma compreensível para a população em geral.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: Sim, analisamos a influência da religião na percepção das mudanças climáticas. Observamos que católicos e kardecistas apresentaram maior grau de preocupação comparado a outras religiões.
No entanto, a amostragem para algumas religiões, como as afro-brasileiras, foi pequena, o que dificulta uma comparação mais precisa. Planejamos futuras pesquisas com uma amostragem mais equilibrada para obter resultados mais robustos.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: A primeira estratégia é melhorar a comunicação científica. Precisamos traduzir o conhecimento científico de forma acessível e compreensível para a população em geral. Isso inclui utilizar diferentes meios de comunicação e adaptar a linguagem às diversas regiões e perfis socioeconômicos do Brasil.
Outra estratégia é desenvolver políticas públicas que considerem as peculiaridades regionais, focando em educação ambiental e inclusão social. A conscientização sobre as mudanças climáticas deve ser integrada ao currículo escolar e às campanhas públicas de informação.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: Sim, o negacionismo climático é um grande problema. Ele cria descrédito na ciência e dificulta a conscientização sobre a importância das mudanças climáticas. Observamos que estados que aderiram mais fortemente a ideais políticos negacionistas tendem a ter menor preocupação com o clima.
Precisamos combater o negacionismo com uma comunicação científica eficaz e políticas públicas que promovam a educação e a conscientização ambiental.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: A pesquisa de percepção das mudanças climáticas é crucial para as agendas geopolíticas ambientais, como a COP28. Ela fornece dados essenciais para entender como a população percebe e se preocupa com o clima, o que é fundamental para desenvolver políticas públicas eficazes.
Esses dados ajudam a orientar as negociações e as estratégias de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, garantindo que as ações sejam baseadas em evidências e atendam às necessidades reais da população.
Rodrigo Felipe Rodrigues do Carmo: A Caatinga é um bioma único, com características peculiares de relevo e clima. As mudanças climáticas têm intensificado os efeitos negativos nesse bioma, como a desertificação e a escassez de água.
As populações da Caatinga, que dependem da agricultura familiar, estão se tornando mais vulneráveis devido à irregularidade das chuvas e à degradação do solo. Isso agrava a desigualdade socioeconômica e dificulta a subsistência dessas comunidades.
Precisamos de políticas públicas específicas para mitigar esses impactos e promover a sustentabilidade na Caatinga, garantindo a qualidade de vida das populações locais e a conservação do bioma.
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